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quinta-feira, 14 de janeiro de 2010




NOTA PÚBLICA

PNDH 3 É AVANÇO NA LUTA POR DIREITOS HUMANOS



O Movimento Nacional de Direitos Humanos (MNDH), rede que reúne cerca de 400 organizações de direitos humanos de todo o Brasil manifesta publicamente seu REPÚDIO às muitas inverdades e posições contrárias ao Programa Nacional de Direitos Humano (PNDH 3) e seu APOIO ao PNDH 3 lançado pelo governo federal no dia 21 de dezembro de 2009.



O MNDH entende que o Programa Nacional de Direitos Humanos 3 (PNDH 3) dá um passo à frente no sentido de o Estado brasileiro assumir direitos humanos em sua universalidade, interdependência e indivisibilidade como política pública; expressa avanços na efetivação dos compromissos constitucionais e internacionais com direitos humanos e resultou de amplo debate na sociedade e no governo. As reações ao PNDH estão cheias de motivações conservadoras e mostram que vários setores da sociedade brasileira ainda se recusam a tomar os direitos humanos como compromissos efetivos tanto do Estado, quanto da sociedade e de cada pessoa.



É falso o antagonismo que se tenta propor ao dizer que o Programa atenta contra direitos fundamentais, visto que o que propõe tem guarida constitucional, além de se constituir no que é básico para uma democracia moderna e que quer a vida como um valor social e político para todas as pessoas, até porque, a dignidade da pessoa humana é um dos princípios fundamentais de nossa Constituição e a promoção de uma sociedade livre, justa e solidária são objetivos de nossa Carta Política.



Há setores que estranham que o Programa seja tão abrangente, trate de temas tão diversos. Ignoram que desde há muito, ao menos desde a Declaração Universal dos Direitos Humanos, de 1948, direitos humanos é muito mais do que direitos civis e políticos. Vários Tratados, Pactos e Convenções internacionais articulam o que é hoje conhecido como o direito internacional dos direitos humanos, que protege direitos de várias dimensões: civis, políticos, econômicos, sociais, culturais, ambientais, de solidariedade, dos povos, entre outras.



Desconhecem também que o Brasil, por ter ratificado a maior parte destes instrumentos, é obrigado a cumpri-los, inclusive por força constitucional, e que está sob avaliação dos organismos internacionais da ONU e da OEA que, por reiteradas vezes, através de seus órgãos especializados, emitem recomendações para o Estado brasileiro, entre as quais, as mais recentes são de maio de 2009 e foram emitidas pelo Comitê de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais da ONU.



Aliás, não é novidade esta ampliação, visto que o Programa Nacional de Direitos Humanos 2 (PNDH II, 2002) já previa inclusive vários dos temas que agora são reeditados e a primeira versão do PNDH (1996) foi criticada e revisada exatamente por não contemplar a amplitude e complexidade que o tema dos direitos humanos exige. Por isso, além de conhecimento, um pouco de memória histórica é necessária a quem pretende informar de forma consistente à sociedade.



Em várias das manifestações e inclusive das abordagens publicadas há claro desconhecimento do que significa falar de direitos humanos. Talvez por isso é que entre as recomendações dos organismos internacionais está a necessidade de o Brasil investir em programas de educação em direitos humanos para que o conhecimento sobre eles seja ampliado pelos vários agentes sociais. Um dos temas que é abordado no PNDH 3 e que poderia merecer mais especial atenção.



O PNDH 3 resulta de amplo debate na sociedade brasileira e no governo. Fatos atestam isso! Durante o ano de 2008 foram realizadas 27 conferências estaduais que foram coroadas pela realização da 11ª Conferência Nacional de Direitos Humanos, em dezembro. Durante o ano de 2009, um grupo de trabalho coordenado pela Secretaria Especial dos Direitos Humanos procurou traduzir as propostas aprovadas pela Conferência no texto do PNDH 3. O MNDH e suas entidades filiadas, além de outras centenas de organizações, participaram ativamente deste processo.



Outros seis meses, desde julho, o texto preliminar está disponível na internet para consulta e opinião. Internamente no governo, o fato de ter sido assinado pela maioria dos Ministérios – inclusive o Ministério da Agricultura – é expressão inequívoca do debate e da construção. É claro que, salvas as consultas, o texto publicado expressa a posição que foi pactuada pelo governo. Nem tudo o que está no PNDH 3 é o que as exigências mais avançadas da agenda popular de luta por direitos humanos esperam. Contém, sim, propostas polêmicas e, em alguns casos, não bem formuladas. Todavia, considerando que é um documento programático, ou seja, que expressa a vontade de realizar ações em várias dimensões, tem força de orientação da atuação, nos limites constitucionais e da lei, mesmo quando propõe a necessidade de revisão ou de alterações de algumas legislações.



Aliás, é prerrogativa da sociedade e do poder público propor ações e modificações tanto de ordem programática quanto legal. Por isso, não deveria ser estranho que contenha propostas de modificação de algumas legislações. Assim que, alegar desconhecimento do texto ou mesmo que não foi discutido é uma postura que ignora o processo realizado. É diferente dizer que se têm divergências em relação a um ou outro ponto do texto do que dizer que o texto não foi discutido ou que não esteve disponível para conhecimento público.





O MNDH entende que as reações publicadas pela imprensa, vindas, em sua maioria de setores conservadores da sociedade, devem ser tomadas como expressão de que o PNDH 3 tocou em temas fundamentais e substantivos que fazem com que caia a máscara anti-democrática destes setores. Estas posições põem em evidência para toda a sociedade as posturas refratárias aos direitos humanos, ainda lamentavelmente tão disseminadas e que se manifestam no racismo que discrimina negros, ciganos, indígenas e outros grupos sociais, no machismo que mantém a violência contra a mulher, no patriarcalismo que violenta crianças e adolescentes, no patrimonialismo que quer o Estado a serviço de interesses e setores privados, no revanchismo de setores militares que insistem em ocultar a verdade sobre o período da ditadura militar e em inviabilizar a memória como bem público e direito individual e coletivo, na permanência da tortura mesmo que condenada pela lei, na impunidade que livra “colarinhos brancos” e condena “ladrões de margarina”, no apego à propriedade privada sem que seja cumprida a exigência constitucional de cumpra a função social, na falta de abertura para a liberdade e a diversidade religiosa que impede o cumprimento do preceito constitucional da laicidade do Estado, no elitismo que se traduz na persistência da desigualdade como uma das piores do mundo, enfim, na criminalização da juventude e da pobreza e na desmoralização e criminalização de movimentos sociais e de defensores de direitos humanos.



O MNDH também repudia a tentativa de politização eleitoral do PNDH 3. O Programa pretende ser uma política pública de Estado e não de candidato; não pertence a um partido, mas à sociedade brasileira e, portanto, não cabe torná-lo instrumento de posicionamentos maniqueístas. Não faz qualquer sentido pretender que o PNDH tenha pretensões eleitorais ou mesmo que pretenda orientar o próximo governo. Quem dera que direitos humanos tivessem chegado a tamanha importância política e fossem capazes de efetivamente ser o centro dos compromisso de qualquer candidato e de qualquer governo.



Assim, o Movimento Nacional de Direitos Humanos (MNDH), reitera sua manifestação, publicada em nota no último 31/12/2009, na qual disse que “cobra uma posição do governo brasileiro que seja coerente com os compromissos constitucionais e com os compromissos internacionais com a promoção e proteção dos direitos humanos. O momento é decisivo para que o país avance para uma institucionalidade democrática que efetivamente reconheça e torne os direitos humanos conteúdo substantivo da vida cotidiana de cada um/a dos/as brasileiros e brasileiras”. Manifesta seu APOIO ao PNDH 3. Entende que o debate democrático é sempre o melhor remédio para que a sociedade possa produzir posicionamentos que sejam sempre mais coerentes e consistentes com os direitos humanos. REJEITA posições e atitudes oportunistas que, desde seu descompromisso histórico com os direitos humanos, tentam inviabilizar avanços concretos na agenda que quer a realização dos direitos humanos na vida de todas e de cada uma das brasileiras e dos brasileiros.



O MNDH também manifesta seu apoio ao ministro Paulo Vannuchi e entende que sua permanência à frente da SEDH neste momento só contribui para reforçar que o PNDH 3 veio para valer. Entende também que se alguém tem que sair do governo são aqueles ministros – entre eles Jobim e Stephanes – ou quaisquer outros prepostos que, de forma oportunista e anti-democrática vêm contribuindo para gerar as reações negativas e conservadoras ao que está proposto no PNDH 3, inclusive contribuindo para enfraquecer a posição do governo e do presidente Lula que, corajosamente e sabedor do conteúdo, assinou o PNDH 3 e o lançou com tão amplo apoio e adesão de vários ministérios do governo federal, manifestação inequívoca de que o PNDH 3 tem apoio da maioria do governo e que não serão uns poucos ministros que o derrubarão.



Em suma, como organização da sociedade civil, o MNDH está atento e envidará todos os esforços para que as conquistas democráticas avancem sem qualquer passo atrás.



Brasília, 11 de janeiro de 2010.



Movimento Nacional de Direitos Humanos (MNDH)









quarta-feira, 6 de janeiro de 2010

Questões Climáticas

COP15: Educação Ambiental, Mudanças de Comportamento e o novo Acordo Climático, artigo de Valdir Lamim-Guedes



Convenção do Clima, educação, mudanças climáticas


[EcoDebate] A Educação Ambiental (EA), tendo por base a alfabetização ecológica, conforme colocada por Fritjof Caprai como a assimilação de princípios ecológicos para o entendimento dos problemas ambientais e soluções destes, é uma das principais ferramentas para a sustentabilidade planetária. Além da EA, o desenvolvimento e adoção de novas tecnologias menos impactantes, com a redução das emissões de poluentes e uma menor extração de recursos naturais, aliada a uma nova conduta da política, com a valorização das pessoas, principalmente, as excluídas socioeconomicamente, são outros fatores integrantes desta busca pela sustentabilidade planetária. Assim, é parte inerente da EA as mudanças de comportamento, como por exemplo, atuar na diminuição do consumo, tomar atitudes menos poluidoras, reduzir o uso do carro, dar preferência aos transportes públicos, comprar produtos socialmente justos e produzidos de maneira mais limpa.

Apesar deste papel central da EA, esta não tem sido alvo dos debates na COP15. As negociações estão baseadas apenas em soluções técnicas para a redução da emissão dos Gases causadores de Efeito Estufa (GEE), com a criação de mecanismos financeiros, como o REDD, e o desenvolvimento e transferência de tecnologia para mitigação e adaptação as mudanças climáticas.





A atual crise não é apenas ambiental ou econômica, e sim civilizatória. A cultura do consumismo leva as pessoas a ignorarem o impacto de suas atividades sobre o meio ambiente e sobre a sociedade. O meio ambiente é atingindo por causa da extração de matérias-primas e por receber os dejetos da produção dos bens de consumo. A sociedade é atingida porque é impossível que todas as pessoas consumam como uma pessoa rica, este nível de consumo está baseado nas desigualdades sociais, já que algumas pessoas acumulam riqueza, enquanto muitas pessoas mal têm condições para manter um consumo calórico diário adequado, traduzindo em números, cerca de 1 bilhão de pessoas estão subnutridas no mundo inteiro (uma em cada seis pessoas).





O combate a estas desigualdades, incentivando a justiça socioambiental, deveria ser um dos carros chefes do debate sobre clima, porque os mais atingidos pelas mudanças climáticas serão os mais pobres (africanos e habitantes de países-ilha) e os maiores impactos ambientais são causados, em sua maioria, por uma minoria rica.





Com este discurso pode-se questionar que a melhoria de vida das pessoas irá levá-las a consumir mais, passando a exercer uma pressão maior sobre o meio ambiente? A resposta é sim. Porém, é justamente aí o desafio, uma maior igualdade entre as pessoas reduzirá o impacto ambiental dos ricos, por outro lado, aumenta o impacto ambiental das pessoas mais pobres. Mas, em resposta a este problema, deve-se buscar estratégias de combate ao consumismo, lembrando que, é justamente o consumismo que mantém o capitalismo e o nível atual da exploração dos recursos naturais.





Desta forma, o novo acordo climático, além de criar estratégias técnicas e financeiras para mitigação e adaptação as mudanças climáticas, deve também ter um forte compromisso pela inclusão de todas as pessoas no processo de respostas às mudanças climáticas e outras questões ambientais. Por que não cada pessoa ter a sua meta de redução da emissão de GEE? Isto pode integrar políticas públicas e institucionais?





Ao invés disto, focam o debate em soluções tecnológicas, caras e, em muitos casos, ainda utópicas ou em desenvolvimento, sem a certeza de que irão funcionar. Este tipo de discurso está intrinsecamente ligado à idéia de que poderemos responder às mudanças climáticas apenas com as novas tecnologias, que o padrão de consumo e outros comportamentos (transportes, por exemplo) não precisam ser alterados.





Uma evidência de que o avanço tecnológico nem sempre é a melhor solução para os problemas enfrentados atualmente é a crise dos alimentos, que não é conseqüência das fracas colheitas a nível global, mas causada pela crise econômica mundial, que tem reduzido rendas e oportunidades de emprego e restringindo o acesso aos alimentos por parte da população mais pobre. Existe uma relação direta entre a crescente mecanização da produção agrícola e o aumento da fome, como conseqüência da concentração da propriedade e da renda. O uso de máquinas deveria atender a produção de alimentos, priorizando o ser humano e não o lucro, já que os alimentos têm sido vistos como commodity, sendo um artigo de especulação negociado em mercados futuros, sem qualquer relação com a demanda real da populaçãoii.





É possível reduzir a nossa pegada ecológica e, ainda assim, alcançar melhores condições de vida para todos de forma sustentável. Esta conquista está visceralmente ligada ao processo de tomada de consciência ambiental, junto com mudanças individuais e coletivas de comportamento. Como já dizia Paulo Freire, reforçado pelo Tratado de Educação Ambiental para Sociedades Sustentáveis e Responsabilidade Global, a educação é um ato político! Desta forma, quando a EA engloba uma visão ampliada do meio ambiente, ou seja, considerado em sua totalidade, incluindo suas dimensões ecológicas, físicas, sociais, políticas, estéticas e econômicas ela passa a ser um fator de transformação da sociedade. Assim, a EA não deve ser ignorada durante esta ultima semana de negociações da COP15, sendo justamente o contrário, que ela passe a ser vista com uma das principais estratégias de combate as mudanças climáticas.





Valdir Lamim Guedes Junior
Mestrando em Ecologia de Biomas Tropicais
Universidade Federal de Ouro Preto